quarta-feira, 25 de julho de 2012

Tuberculose persiste em áreas de baixa renda e alta densidade populacional em Olinda

Por Renata do Amaral, UFPE

A taxa de incidência da tuberculose em Olinda é quase duas vezes maior que a nacional. O município conta com uma média de 300 novos casos da doença por ano. A professora Rita Maria Zorzenon dos Santos, do Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco, em colaboração com outros pesquisadores, recorreu à Física Estatística para tentar entender as causas da prevalência elevada da doença na cidade.

A conclusão do estudo indica que os focos de contaminação estão, conforme previsões anteriores, em setores de baixa renda e baixa instrução, mas distinguem-se de outros setores censitários com características idênticas pelo elevado número de mulheres chefes de família sem instrução e com renda menor que um salário mínimo. O estudo também demonstra uma relação estreita entre persistência da doença na comunidade e alta densidade domiciliar.

Mas o que Física e tuberculose têm em comum? Segundo Rita Zorzenon, as abordagens da Física Estatística buscam conectar comportamentos microscópicos com observações macroscópicas, descrevendo comportamentos coletivos e propriedades emergentes nos sistemas. O trabalho mostra que esse tipo de abordagem pode ser aplicado não só em sistemas físicos, mas também para descrever a disseminação de uma doença numa comunidade.

A pesquisa “Vigilância da tuberculose: uma abordagem interdisciplinar na análise do processo endêmico em Olinda” foi realizada em parceria com os pesquisadores Wayner de Sousa e Fátima Militão de Albuquerque, do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães, da Fundação Oswaldo Cruz (CPqAM-Fiocruz); Célio Lopes Silva, Antônio Ruffino Netto e Carlos Zárate-Bladés, da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto; e Silvina Ponce-Dawson e Ana Amador, do Departamento de Física da Universidade de Buenos Aires. Além de multi-institucional, o trabalho tem caráter multidisciplinar, envolvendo físicos, médicos, bioquímicos e estatísticos. O objetivo da equipe foi analisar dados que complementassem as estatísticas usuais e apresentar os resultados de maneira simples, para sensibilizar as autoridades públicas.

A tuberculose ainda é uma pandemia que atinge 30% da população mundial e mata três milhões de pessoas todo ano. No Brasil, há entre 35 e 45 milhões de pessoas infectadas (quase 25% da população), com 100 mil novos casos e cinco a seis mil óbitos por ano (dados referentes a 1981 a 2000). De acordo com a Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde, trata-se de uma doença infectocontagiosa causada por uma bactéria que afeta principalmente os pulmões, mas também pode ocorrer em outros órgãos do corpo, como ossos, rins e meninges.

CENSO – Segundo a professora, a experiência mostra que, para entender os processos epidemiológicos ou endêmicos, é preciso traçar o caminho da doença. Para encontrar esses percursos, a pesquisa recorreu ao georreferenciamento dos novos casos anuais de tuberculose em Olinda em relação aos setores censitários da cidade, definidos a cada censo pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas unidades correspondem a regiões demarcadas que contêm 1.200 habitantes ou 300 domicílios.

No censo de 2000, Olinda foi dividida em 299 setores pelo IBGE. O estudo analisa a correlação no espaço e no tempo dos novos casos de tuberculose entre 1996 e 2000, com base nas notificações mensais. Os resultados mostram que 82% dos setores que compõem os focos têm mais de um caso por família, casos de retratamento ou ambos; 90% estão localizados em setores de baixa renda ou baixa instrução; e 90% têm em média dez casos da doença durante os cinco anos consecutivos.

O estudo mostra também que existe uma rede de setores censitários responsáveis pela manutenção dos focos, que coincide com as regiões de alta densidade domiciliar. Os resultados corroboram as hipóteses baseadas em observações de que a contaminação acontece via interações com a vizinhança, ou seja, com pessoas que têm contatos mais íntimos e prolongados com pacientes infectados.

O trabalho confirma que o controle da tuberculose precisa ser territorial e não apenas de indivíduos infectados ou em risco. A pesquisa, de baixo custo e fácil compreensão para quem administra a saúde pública, deixa claro onde estão os setores censitários que atuam como focos e como funciona o processo dinâmico de disseminação. Com os dados em mãos, fica mais fácil estabelecer estratégias de ação, com melhor investimento dos recursos financeiros e humanos.

O grupo espera que as autoridades competentes tomem conhecimento do potencial da metodologia para o controle da tuberculose.Essa metodologia pode ser aplicada a outras doenças e/ou processos sociais, como, por exemplo, no estudo do aumento da violência nas cidades.

DIVULGAÇÃO – O resultado do estudo foi publicado na revista PLoS ONE, com o título “A dynamic analysis of tuberculosis dissemination to improve control and surveillance”. O artigo mostra que o entendimento das interações dinâmicas entre fatores biológicos, ambientais, sociais e econômicos que favorecem a disseminação de certas doenças é útil para planejar estratégias de controle mais efetivas. 

Para a professora Rita Maria Zorzenon dos Santos, esse tipo de informação pode contribuir para melhoria de alocação de verbas, distribuição de medicamentos, recrutamento de recursos humanos e planejamento de programas de vacinação. Além de sua utilidade no caso da tuberculose, que mata uma pessoa a cada 15 segundos no mundo, a metodologia pode ser aplicada para o estudo de outras doenças ou outros processos sociais, sempre levando em conta as especificidades do processo e da distribuição da população.

Para mais informações:

Departamento de Física da UFPE
http://www.df.ufpe.br/
Professora Rita Maria Zorzenon dos Santos
rita.zorzenon@gmail.com
zorzenon@df.ufpe.br